Dos Andes para o céu
Data de publicação: 02/10/2015

Direções do olhar científico
Há cerca de 40 mil anos o ser humano observa o firmamento e identifica as constelações de estrelas e os movimentos do Sol e da Lua. Ao compreenderem as fases lunares e os ciclos do sol nascente e poente que mudava de lugar entre as montanhas, os astrônomos do passado sincronizaram com o céu os tempos de semeadura e de colheita e as atividades pastoris.
A cronometria entre os ciclos da natureza terrestre e astronômica e as atividades humanas interpretadas por magos e sacerdotes a partir da experiência do sagrado originaram calendários fixados em pedra e reservados nos centros cerimoniais e nos oráculos situados em pontos estratégicos de incidência da luz do sol ou da posição das estrelas.
A Terra é o espelho do céu

A crença de que os grandes rios e lagos refletem as constelações é comprovada pelo estudo dos primeiros centros urbanos com seus templos erguidos às margens dos rios sagrados.
Mircea Eliade, no livro O mito do eterno retorno (Edições 70, 1993), analisa mitologias da Mesopotâmia e mostra que tanto os rios Tigre e Eufrates tinham seus modelos celestes nas constelações, como tambêm as cidades: Sipar era a constelação de Câncer e Nínive, a da Ursa maior. Correspondências geográficas com a Via Láctea se encontravam no vale do rio Nilo no Egito e em Tepoztlán, no México. A atual peregrinação mítica a Santiago de Compostela (Espanha), deu à Via Láctea o título popular de Caminho de São Tiago.
Inca o imperador do sol
A cordilheira dos Andes é a mais extensa cadeia de montanhas do planeta. Percorre 7.500 quilômetros, do extremo norte da Venezuela até a Terra do Fogo. Picos altíssimos se projetam nas nuvens como ponteiros que durante milênios mostraram com precisão de relógios as diferentes posições do Sol nas várias estações do ano.
O Império do Inca, em quéchua: Tawantinsuyu, instalado por volta do ano 1200 d.C., dominou cerca de 700 povos habitantes dos vales da cordilheira, desde a Colômbia, Peru, Bolívia e Chile até a Argentina. O imperador residia no vale sagrado do rio Vilcanota, nos arredores da cidade de Cuzco (Peru), onde seus arquitetos incrustaram nas montanhas, em um todo coerente com o vale, as edificações que reproduziam o firmamento, tal qual era observado dia e noite.
O sacerdote do Deus Criador Viracocha e do deus sol Inty era um texto sagrado vivo. Consultavam-no os conselheiros do Inca e os astrônomos que, instalados nos observatórios em pontos estratégicos da cordilheira, controlavam as mudanças do Sol e da Lua e fixavam os solstícios de inverno e de verão, os dias exatos para os rituais sagrados, as semeaduras e as colheitas e organizavam a vida social e religiosa do povo.
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O primeiro filete de luz solar passa entre duas montanhas, na penumbra da madrugada, na manhã do solstício de inverno (21 de junho) e ilumina um ponto do vale sagrado onde a mitologia inca situou o santuário de Picaritampu, a Casa do Amanhecer. É o local do nascimento do sol. Do mesmo local flui o rio Vilcanota que fertiliza o vale e serpenteia em meio às montanhas até lançar-se no oceano Pacífico e, no horizonte do mar, unir-se ao céu em forma de um rio de estrelas.
Do espaço, o rio volta ao vale por meio da chuva e fecha o ciclo eterno de encontro entre os mortais e as divindades, em um único organismo vivo, cada estrela é a forma original de um ser da Terra e, ao morrerem, as pessoas assumem definitivamente a forma celestial. Descendentes dos súditos do Inca até hoje pontilham o vale com oferendas ao rio, na crença de que suas preces e invocações levadas ao céu descerão como bênçãos.
Traduzida do quéchua para o espanhol pelo cronista nativo Juan de Santa Cruz Pachacuti, em 1613.

Gregoriano Quéchua Tradução
Janeiro Huchug Pacoy Pequena colheita
Fevereiro Hatun Paçoy Grande colheita
Março Pawqar Waraq Ramos floridos
Abril Ayriwa Dança do milho em flor
Maio Aymvaray Canção da colheita
Junho Inti Raymi Renascimento do sol
Julho Anta Situwa Purificação da terra
Agosto Qapaq Situwa Sacrifício de purificação
Setembro Qaia Raymi Festival da rainha
Outubro Uma Raymi Festival da água
Novembro Ayamarqa Procissão dos antepassados
Dezembro Qapaq Raymi Festival de verão

A ti, com meus olhos imperfeitos
Quero ver.
Pois vendo-te, conhecendo-te, Entendendo-te,
Me verás e me conhecerás.
O Sol e a Lua, o dia e a noite,
O verão e o inverno
Não vão sem motivo
Ao lugar a eles reservado
E chegam ao seu fim.
Qual seja o cetro que me fizeste levar,
Ouve-me,
Escuta-me,
Porque eu ainda não estou cansado,
Porque eu ainda não estou morto.
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Fonte: Diálogo 54 - MAI/2009
Postado por: Diálogo
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