A arte feita de palavras
Data de publicação: 24/03/2014
A arte literária expressa de maneira eloquente a experiência do Sagrado. Veja como alguns escritores exprimem a presença do Transcendente em suas composições. No dito ou no não dito, nos interstícios da linguagem ou de forma direta, a vivência religiosa é expressa com arte e beleza.
O infante
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse
Sagrou-te e foste desvendando a espuma.
E a orla branca foi de ilha em continente
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.
Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!
São Francisco
Lá vai São Francisco
Pelo caminho
De pé descalço
Tão pobrezinho
Dormindo à noite
Junto ao moinho
Bebendo a água
Do ribeirinho.
Lá vai São Francisco
De pé no chão
Levando nada
No seu surrão
Dizendo ao vento
Bom-dia, amigo
Dizendo ao fogo
Saúde, irmão.
Lá vai São Francisco
Pelo caminho
Levando ao colo
Jesuscristinho
Fazendo festa
No menininho
Contando histórias
Pros passarinhos.
“Muita religião, seu moço! Eu, cá, não perco ocasião de religião. Aproveito de todas. Bebo água de todo rio... Uma só para mim é pouca, talvez não me chegue.”
Guimarães Rosa
Meu Deus, me dê a coragem
Meu Deus, me dê a coragem de viver
Trezentos e sessenta e cinco dias e noites,
Todos vazios de tua presença.
Me dê a coragem de considerar esse vazio
Como uma plenitude
Faça com que eu seja a tua amante humilde,
Entrelaçada a ti em êxtase.
Faça com que eu possa falar
Com este vazio tremendo
E receber como resposta
O amor materno que nutre e embala.
Faça com que eu tenha a coragem de te amar,
Sem odiar as tuas ofensas à minha alma
e ao meu corpo.
Faça com que a solidão não me destrua.
Faça com que minha solidão
me sirva de companhia.
Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar.
Faça com que eu saiba ficar com o nada
E mesmo assim me sentir
Como se estivesse plena de tudo.
Receba em teus braços
O meu pecado de pensar.
Meu Deus, me dê a coragem de viver
Trezentos e sessenta e cinco dias e noites,
Todos vazios de tua presença.
Me dê a coragem de considerar esse vazio
Como uma plenitude
Faça com que eu seja a tua amante humilde,
Entrelaçada a ti em êxtase.
Faça com que eu possa falar
Com este vazio tremendo
E receber como resposta
O amor materno que nutre e embala.
Faça com que eu tenha a coragem de te amar,
Sem odiar as tuas ofensas à minha alma
e ao meu corpo.
Faça com que a solidão não me destrua.
Faça com que minha solidão
me sirva de companhia.
Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar.
Faça com que eu saiba ficar com o nada
E mesmo assim me sentir
Como se estivesse plena de tudo.
Receba em teus braços
O meu pecado de pensar.
Clarice Lispector
Reza, Maria
Suam no trabalho as curvadas bestas
E não são bestas, são homens, Maria!
Corre-se a pontapés, os cães na fome dos ossos
E não são cães, são seres humanos, Maria!
Feras matam velhos, mulheres e crianças
E não são feras, são homens
E os velhos, as mulheres e as crianças
São os nossos pais,
Nossas irmãs e nossos filhos, Maria!
Crias morrem à míngua de pão
Vermes na rua estendem a mão à caridade
E nem crias nem vermes são
Mas aleijados meninos sem casa, Maria!
Do ódio e da guerra dos homens
Das mães e das filhas violadas
Das crianças mortas de anemia
E de todos os que apodrecem nos calabouços
Cresce no mundo o girassol da esperança
Ah! Maria
Põe as mãos e reza
Pelos homens todos
E negros de toda a parte
Põe as mãos
E reza, Maria!
Suam no trabalho as curvadas bestas
E não são bestas, são homens, Maria!
Corre-se a pontapés, os cães na fome dos ossos
E não são cães, são seres humanos, Maria!
Feras matam velhos, mulheres e crianças
E não são feras, são homens
E os velhos, as mulheres e as crianças
São os nossos pais,
Nossas irmãs e nossos filhos, Maria!
Crias morrem à míngua de pão
Vermes na rua estendem a mão à caridade
E nem crias nem vermes são
Mas aleijados meninos sem casa, Maria!
Do ódio e da guerra dos homens
Das mães e das filhas violadas
Das crianças mortas de anemia
E de todos os que apodrecem nos calabouços
Cresce no mundo o girassol da esperança
Ah! Maria
Põe as mãos e reza
Pelos homens todos
E negros de toda a parte
Põe as mãos
E reza, Maria!
José Craveirinha – Moçambique
O infante
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse
Sagrou-te e foste desvendando a espuma.
E a orla branca foi de ilha em continente
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.
Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!
Fernando Pessoa
São Francisco
Lá vai São Francisco
Pelo caminho
De pé descalço
Tão pobrezinho
Dormindo à noite
Junto ao moinho
Bebendo a água
Do ribeirinho.
Lá vai São Francisco
De pé no chão
Levando nada
No seu surrão
Dizendo ao vento
Bom-dia, amigo
Dizendo ao fogo
Saúde, irmão.
Lá vai São Francisco
Pelo caminho
Levando ao colo
Jesuscristinho
Fazendo festa
No menininho
Contando histórias
Pros passarinhos.
Vinícius de Moraes
Fonte: Diálogo 33 - Fev/2004
Postado por: Diálogo
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